sábado, 20 de julho de 2013

Série: 50 anos da Renúncia de Jânio Quadros

Fonte: Veja.abril

*A presidência breve

Sete meses na montanha-russa

O governo de Jânio tangenciou o penhasco com perturbadora frequência, alternando freadas bruscas com acelerações vertiginosas. O abandono prematuro do governo foi uma das cenas desse mesmíssimo roteiro

31 de janeiro de 1961 - Jânio Quadros discursa durante a cerimônia de diplomação no Tribunal Superior Eleitoral
31 de janeiro de 1961 - Jânio Quadros discursa durante a cerimônia de diplomação no Tribunal Superior Eleitoral - Acervo Iconographia

Em 1° de fevereiro de 1961, 24 horas depois da posse de Jânio, a maioria oposicionista no Congresso ameaçou-o com a convocação de uma sessão especial da Câmara e do Senado caso continuasse hostilizando o antecessor. O novo presidente reagiu com a criação de cinco comissões de sindicância, chefiadas por militares e incumbidas de investigar “focos de corrupção” que dizia ter herdado de JK. Nos 204 dias seguintes, o Brasil viajou numa montanha-russa monitorada por um quarentão que obedecia a impulsos ditados pelo instinto. Sempre dera certo.

Tangenciando o penhasco com perturbadora frequência, alternando freadas bruscas com acelerações vertiginosas, entre uma crítica a Juscelino e um ataque ao Poder Legislativo, Jânio aumentou de seis para oito horas o expediente dos servidores públicos, tornou obrigatório o cartão de ponto, exonerou todos os contratados nos cinco meses anteriores, suspendeu nomeações por um ano, reduziu o orçamento das Forças Armadas e o soldo dos militares em serviço no exterior, diminuiu o número de funcionários em todas as embaixadas, tabelou o preço do arroz e do feijão, solidarizou-se com Fidel Castro no episódio da invasão de Cuba financiada pelos Estados Unidos, baixou medidas de combate ao monopólio, desvalorizou a moeda, determinou ao Itamaraty que apressasse o restabelecimento de relações diplomáticas com a União Soviética, proibiu biquíni na praia, maiô em concurso de miss, lança-perfume, corridas de cavalo em dias úteis, veiculação de comerciais no cinema e brigas de galo, ordenou a prisão de um general que presidira a Petrobras e tirou do ar por três dias a Rádio JB para puni-la por críticas ao governo, mobilizou o Exército para reprimir uma greve de estudantes em Recife, brigou com a UDN, afastou-se dos demais partidos que tentavam ampará-lo, instituiu o governo itinerante, regulamentou a remessa de juros para o exterior, enviou o vice João Goulart à China em missão oficial, condecorou Che Guevara e rompeu com Carlos Lacerda.

No 207° dia de governo, renunciou à Presidência da República.
 

As decisões histriônicas e as decisões sérias de Jânio Quadros

Em Brasília, Jânio alimentou sua inclinação por medidas idiossincráticas, exageradas e muito esquisitas. Por outro lado, o presidente fez decretos de algum bom senso para aquela época 

1.Brigas de galo

 
4 de novembro de 1959 - Apostadores em rinha de galo em São Paulo aguardam o começo da briga
Em 18 de maio de 1961, Jânio decretou a proibição das rinhas em todo o país. Em um tempo em que o politicamente incorreto inexistia e os cuidados com animais soavam como bizarrice, o veto virou manchete de jornal. E também provocou gritaria: o esporte de péssimo gosto movimentava uma dinheirama em aposta.

2. Hipnotismo

 
1º de outubro de 1959 - Pessoas em profundo sono hipnótico durante espetáculo no Colégio Diocesano, em São Paulo, promovido pelo irmão marista Vitricio, a maior autoridade brasileira em letargia
Decreto de 22 de julho de 1961. No início dos anos 60, os espetáculos de mesmerismo faziam imenso sucesso. Jânio resolveu proibi-los para impedir o uso falsamente medicamentoso dos truques. O problema é que ninguém estava muito interessado no assunto.

3.Concurso de miss

 
8 de junho de 1961 - A Miss Brasil Staël Maria Rocha Abelha posa de maiô acompanhada de outras misses no último concurso antes da proibição de Jânio
Moralista e mulherengo, o presidente decidiu que as participantes dos concursos de beleza não podiam se apresentar em "trajes de banho, sendo tolerado o uso de saiote". A regra nunca foi aplicada, embora tenha sido revogada apenas em 1991. Para fazê-la funcionar, foi criada a polícia de costumes, outro exotismo dispensável da era janista.

4.Preservação ambiental

 
Década de 50 - Integrante da expedição Roncador-Xingu, organizada pelos irmãos Villas Boas, entrega roupas para índios cuicuru na região do Alto Xingu. Num ato pioneiro de cuidado com o ambiente, Jânio criou vários parques nacionais e reservas florestais. O Parque Nacional do Xingu foi o primeiro nascido com a ideia de preservar a "área como reserva florestal e campo de estudo de riquezas naturais brasileiras", em 14 de abril de 1961.


5.Política externa independente

 
1° de janeiro de 1961 - Mao tsé-Tung aproveita para descansar enquanto viaja de trem para a Montanha de Lushan. O comunista chinês recebeu o vice-presidente João Goulart quando de sua viagem oficial à China. Jango esteve lá quando Jânio renunciou Jânio resolveu retomar as relações com a China, que estavam estremecidas desde a instalação de Mao tsé-Tung no poder, em 1949. A aproximação com a China e outras nações comunistas, como Cuba e a antiga União Soviética, fazia parte do plano de política externa independente, coordenado pelo ministro das Relações Exteriores Afonso Arinos, que procurava estabelecer relações comerciais e diplomáticas com todas as nações.

6.Restrições econômicas

 
7 de maio de 1961 - O ministro da Fazenda, Clemente Mariani, foi o grande responsável pela implementação das medidas econômicas do governo janista
Na tentativa de equilibrar a balança comercial, Jânio acabou com subsídios ao câmbio que beneficiavam determinados grupos econômicos importadores. O presidente também limitou e regulamentou a remessa de lucros para o exterior das empresas multinacionais, ideias de seu ministro da Fazenda, Clemente Mariani.

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