domingo, 17 de março de 2013

O Príncipe - Maquiavel

Fonte: Faculdade Sul-Americana (FASAM) Goiânia Texto do Professor: Alexandre Francisco de Azevedo Disciplina: Teoria Geral do Estado & Ciência Política

" Nicolau Maquiavel, autor do livro intitulado “O Príncipe”, escrito no ano de 1513, em Florença, na região italiana Toscana, viveu entre 1469 e 1527, tendo a primeira edição de seu opúsculo publicada postumamente, em 1532. Neste ano, após a dissociação do governo da cidade e a volta da dinastia Médici ao poder, Maquiavel foi preso, inculpado de tramoia e conspiração.

O pontífice Leão X, entretanto, concedeu-lhe remissão e, assim sendo,Nicolau retirou-se da vida pública, após ter ingressado na carreira diplomática num período em que Florença vivia uma República, após a destituição dos Médici do poder, passando, a partir de então, a escrever suas grandes obras. É considerado um dos principais intelectuais do Renascimento, pois inaugurou o pensamento político moderno, sendo, portanto, considerado o pai da Ciência Política e um dos fundadores da base da legitimação do poder, tão necessária em meio a constantes períodos conturbados da vida política pretérita e hodierna.

É necessária uma contextualização histórica para que, só assim, possamos compreender os motivos que influenciaram e impulsionaram Maquiavel a escrever tão bela obra, detentora de experiências vivenciadas pelo autor e observadas pelo mesmo desde a Antiguidade Clássica - quando cita exemplos gregos, romanos e de vários outros povos - até a Idade Média e início da Idade Contemporânea, quando da instável disputa política pelo controle e manutenção territorial das cidades-estados da Península Itálica.

Alguns estudiosos especialistas na área dizem que Maquiavel escreveu a obra para tentar obter confiança do duque de Urbino, Lorenzo I de Médici (1492- 1519), a quem fez uma dedicatória no término da obra, creditando neste a possibilidade de angariar um cargo público novamente, fato não consubstanciado.
Deixando aquém todos os interesses políticos e subjetivos que levaram Maquiavel a escrever a obra, dirijamo-nos para o principal assunto abordado no texto, dotados de imparcialidade: os tipos de principados, as formas de governá-los, mantê-los e ampliá-los, ou seja, o paradigma aparentemente paradoxal a ser seguido, caso ambicionarmos nos tornar exímios príncipes.

Já no início do livro, define os principais tipos de principados, que os são o hereditário, o novo e o misto, devendo o príncipe possuir grande diligência quanto à arte de guerrear para que logre êxito em sua sucessão, no primeiro caso; em sua conquista, no segundo; e, por derradeiro, em sua invasão e inclusão ao velho principado, devendo, em todos os casos, possuir maior atenção em relação às formas pelas quais conseguirá mantê-los sob seu domínio. Além disso, afirma que, na prática da guerra e na manutenção do poderio, os príncipes são guiados pela fortuna, isto é, pela sorte e circunstâncias, ou por suas virtudes, ou seja, pelos seus méritos, qualidades e valores.

O principado hereditário é relativamente fácil manter, porquanto o herdeiro é aceito por seus súditos facilmente, mantendo-se soberano sem obstáculos, a menos que uma força maior o destitua. Em contrapartida, o principado novo é o que demanda maior diligência por parte do príncipe, uma vez que o mesmo que tomou o poder será imediatamente avaliado pelos novos súditos, que acreditam poder melhorar de condição amotinando-se contra o novo dominador, que deverá não apenas oprimi-los, mas também agradá-los, e honrar a dívida para com os provincianos que dominou.

Os principados mistos, por sua vez, demandam também grande zelo, uma vez que acostumados a outras culturas, haverá divergências de línguas, leis e costumes entre o novo e o velho principado. Porém, a fim de precaver um possível infortúnio, Maquiavel nos diz a forma para o tolhermos, sendo preciso extinguir a linhagem de sangue do príncipe anterior e não alterar as leis vigentes, nem o fisco. Assim, em diminuto tempo, o novo principado será totalmente anexado ao antigo.

Maquiavel diz, ainda, que a guerra não se evita, apenas se adia em favor de outrem e a posterga, sendo vantajoso apenas para o oponente, dado que o ser humano possui como característica inata o desejo de conquista. Ademais, recomenda que todo tipo de insurreição interna, por mais que seja propedêutica, abolida na raiz seja, porquanto não se pode empreender uma guerra sem preparo para tal.
Sendo uma forma dos homens serem louvados ou vituperados, recomenda-se que seus objetivos e pensamentos estejam permanentemente voltados à guerra, dado que é a atitude esperada e inerente ao exercício do poder, pois é a arte de quem comanda. Afirma, ainda, que o príncipe deve manter a fama de cruel, pois isto auxilia a manter a tropa unida e disposta ao combate. Além disso, visto que a guerra traz prestígio, recomenda aos mesmos que empreendam grandes campanhas militares para legar memoráveis exemplos de si mesmos, pois não há nada, além disso, que faça um príncipe quisto.

Há duas formas de transmutar-se de homem privado a príncipe, seja elas por meios execrável e celerados, ou graças ao favor de seus concidadãos. Na primeira, incluem-se os soberanos que tomaram o poder por atitudes criminosas, como massacres, traições, crueldades, assassinatos e selvageria; na segunda, o soberano constitui um principado civil. Para obtê-lo, diferentemente dos demais, não é preciso fortuna, nem virtude, mas astúcia e apoio popular ou dos poderosos.

Segundo Maquiavel, ao tomar um Estado, o príncipe usurpador deve fazer a maldade de uma só vez, para que não seja apreciada vagarosamente pelo paladar da população, devendo praticar a violência com um só golpe. Diferentemente dos benefícios, que devem ser feitos aos poucos, para que as pessoas os apreciem por longo período, e esqueçam as coisas ruins pretéritas, tranqüilizando os súditos e os seduzindo.
Discorrer sobre os principados eclesiásticos, para Nicolau, seria presunçoso e temerário, uma vez que estes são manteúdos por antigas leis religiosas, louvados e mantidos por Deus, pois, sendo governados por razões superiores, que a mente humana não alcança. São tão insignes que, não importando como os príncipes vivam ou se comportem, conseguem os conservar no poder.

Há uma distinção entre os soldados próprios, mercenários, auxiliares e mistos. As armas próprias são aquelas compostas por cidadãos, súditos e vassalos, sendo a mais segura de todas, pois, sem elas, o príncipe fica inteiramente à mercê da fortuna; as mercenárias combatem não por lealdade, mas por interesse ou dinheiro, pois são inúteis e perigosas, uma vez que são desunidas, indisciplinadas, ambiciosas e infieis; já as auxiliares, solicitadas a outro poderoso para que o defenda, são piores que as anteriores, porquanto assim que tiverem a oportunidade de destruir-lhe, o farão, caso seja menos poderoso que aquele; numa mistura das anteriores, obtemos as armas mistas, cujo próprio adjetivo já ostenta o significado e importância momentânea da mesma.

Nos tempos quiescentes e brandos, Maquiavel ainda nos recomenda a estarmos em constante treinamento à guerra, caso esta nos surpreenda, através da faculdade de conhecer bem o território, para localizar o inimigo, montar acampamentos, fugir às emboscadas, conduzir a tropa, organizar expedições, armadilhas e, em boas situações, assediar outras províncias. Um excelente exercício também é a observação dos soberanos anteriores, da forma como conduziram as guerras, analisando os motivos de suas vitórias e derrotas. Deve aproveitar, pois, este período com destreza, para que quando sua fortuna for mudada e advierem as adversidades, esteja preparado para o combate.
Os principais vícios e riscos que colocam em perigo o governo do príncipe, segundo o autor, é ser miserável, avarento, rapace, desleal, sanguinário, efeminado e pusilânime, lascivo, soberbo, inflexível e incrédulo, devendo estes adjetivos ser extintos ou, pelo menos, raros a um príncipe.

O livro também nos exorta quanto à liberalidade, sendo esta um fator perigoso no que diz respeito a ser fausto e luxuoso, pois sobrecarrega a população de tributos e arrecadações, necessárias para manter a reputação do príncipe, o que fará com que este seja odiado ou desprezado pelos súditos. Para Maquiavel, entretanto, ser liberal é uma vantagem ao dominador, desde que seja comedida; outrossim, em benefício dos cidadãos, ele não deverá se importar com o labor de avarento, pois o deverá ser para manter a parcimônia e evitar que seus cidadãos empobreçam.
É preciso, sobremaneira, inspirar temor sem promover o ódio, em uma alusão maquiavélica, pois é preferível e mais seguro ser temido, que amado, porquanto é difícil conciliar as duas coisas, dado que o vínculo de amor entre os homens é frágil, uma vez que é mantido por reconhecimento e passível de ser rompido pelo egocentrismo.

Nas palavras de Maquiavel, os homens se esquecem com maior rapidez da morte de um pai que da perda do patrimônio, pois eles são essencialmente maus e, em geral, são ingratos, dissimulados, inconstantes, avessos ao perigo e gananciosos; sendo assim, é precípuo e fundamental que o príncipe não o ameace e, máxime, também não tome as mulheres de seus concidadãos, a fim de tolher as insurreições internas e não ensejar o ódio à população.

Para o autor, ainda, existem duas matrizes de combate, sendo a primeira o combate por meio das leis, e a segunda por uso da força, própria dos animais; sendo a primeira matriz um tanto quanto ineficaz, torna-se necessário evocar a segunda. O príncipe precisa ser raposa e leão, metaforicamente, visto que a raposa tem grande astúcia e o leão muita força, combinação perfeita para proceder com inteligência, sabedoria e vigor, quando necessário.
Maquiavel recomenda, outrora, que o príncipe tenha atitudes humanitárias e munificentes para com o cotidiano da cidade e a vida civil econômica, sem, no entanto, deixar de manter a majestade de seu posto, estimulando os cidadãos a exercer seus ofícios no comércio, na agricultura e em outras atividades; oferecer hospitalidade aos homens virtuosos e aos artistas; assegurando o direito à propriedade e incitando a abertura de novos negócios, sem que os tributos sejam um empecilho à atividade mercantil. Ademais, deve promover espetáculos e festas, reunindo-se com a comunidade, conhecendo os bairros e corporações, valendo-se da política do pão e circo.

O príncipe não pode se apoiar por inteiro na fortuna, segundo Maquiavel, pois ele se arruinará tão logo as circunstâncias mudem, porquanto a fortuna determina apenas parte das ações humanas e a outra parte é governada pelo livrearbítrio, podendo, sim, os homens mudarem o mundo – ao contrário do que muitos pensam que este é governado apenas pela fortuna e por Deus. Muitos ainda acham que não vale a pena lutar pelo curso das coisas e, por isso, deixam se conduzir pelo destino e pela sorte.

Maquiavel ainda compara a fortuna a um rio caudaloso e devastador, que com suas águas enfurecidas alaga planícies, derruba árvores e faz ruir construções, quando tomado por ímpeto. O príncipe precavido, entretanto, constrói diques, barragens e canais de irrigação para que, quando advir a impetuosidade do rio, seu principado não seja assolado pela fúria das águas, uma vez que estas são distribuídas com destreza aos canais previamente construídos. Se a virtude não lhe colocar freios, portanto, a fortuna demonstra toda a sua potência; o autor compara, igualmente, a fortuna à mulher, que é favorável aos jovens, pois são menos respeitosos, mais ferozes e audaciosos, comandando com maior facilidade. É melhor ser impetuoso que prudente, portanto, para comandar a fortuna, pois apenas por meio da virtude um príncipe pode vencer a instabilidade da fortuna e, assim, conservar seu território."

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